O Vaticano disse nesta segunda-feira que o seu ex-núncio apostólico na República Dominicana, destituído em junho por abusar sexualmente de crianças no país caribenho, foi também despojado de sua imunidade diplomática e poderá enfrentar extradição, visto que seus recursos nos tribunais da Igreja se esgotaram.
A reportagem é de David Gibson, publicada por Religion News .
A decisão do Vaticano de chamar, discretamente, JozefWesolowski a Roma no ano passado para enfrentar as acusações aqui e não na República Dominicana provocou protestos e, segundo os críticos, minaram o a promessa do Papa Francisco de ser duro com os padres abusadores, não importando quem eles sejam.
A saga de Wesolowski foi contada em detalhe no domingo. O jornal The New York Times deu-lhe destaque de primeira página, o que provocou uma resposta na segunda-feira por parte do porta-voz do Vaticano, que insistiu inexistir acobertamento e que o Vaticano agiu “rápida e corretamente”.
O padre jesuíta Federico Lombardi disse que o Papa Francisco está “devida e cuidadosamente informado” sobre o status do caso Wesolowski e que quer resolvê-lo de “com justiça e rigor”.
“Devemos finalmente afirmar que o núncio apostólico” – título do Vaticano para um embaixador – “já cessou as funções diplomáticas e perdeu a imunidade associada, podendo ser também submetido a procedimentos judiciais dos tribunais que possam ter competência específica sobre ele”, disse Lombardi.
Não está claro o que isso poderia significar para Wesolowski. O Vaticano não possui um acordo de extradição com a República Dominicana, embora a Itália pudesse decidir tentar extraditá-lo caso ele deixasse os limites da cidade-Estado de 108 acres.
Em junho, o ex-arcebispo foi visto por um prelado dominicano enquanto andava pelo bairro histórico de Roma. “O silêncio da Igreja tem magoado o povo de Deus”, escreveu Dom Victor Masalles num tweet depois de avistar Wesolowski.
As autoridades da Polônia, país em que nasceu Wesolowski, vêm tentando a sua extradição também.
Uma outra questão que complica o caso é o fato de que, segundo observou Lombardi na segunda-feira, Wesolowski tenha apelado de sua destituição. Disse que a apelação seria julgada “sem demora” e que a questão deve estar resolvida até outubro, o que seria extraordinariamente rápido segundo os padrões vaticanos.
A essa altura, o “processo penal” dos “departamentos judiciários civis” do Vaticano – que são separados dos tribunais canônicos que, em geral, deliberam sobre assuntos relacionados ao clero e aos sacramentos – poderá começar. Não se sabe quanto tempo este processo poderia levar e como ou se o Vaticano poderia punir Wesolowski caso for condenado.
Segundo o The New York Times, as leis da cidade do Vaticano dizem que todo aquele que for culpado por abusos sexuais pode passar, no máximo, 12 anos na prisão e pagar uma fiança de aproximadamente 200 mil dólares.
Apesar de ter sido saudado por uma série de reformas e movimentos ousados durante o seu primeiro ano como papa, Francisco vem enfrentando crítica por não agir, com a mesma velocidade, na resolução dos casos de abuso sexual de menores por parte do clero.
No ano passado, Francisco finalmente criou um painel que tenta estabelecer padrões uniformes para dioceses católicas ao redor do mundo, e em julho convidou várias vítimas de abusos sexuais cometidos por padres para participar de uma série de encontros. Estes momentos foram saudados como provas de seu compromisso em estabelecer um novo curso para o assunto dos abusos. Ele também tem insistido que os bispos, assim como os padres, precisam ser responsabilizados. “Não existem privilégios”, disse o papa aos jornalistas em maio.
Porém os críticos dizem que o pontífice precisa fazer mais e mais rapidamente, e citaram o caso Wesolowski como um exemplo do tratamento especial que, segundo estes, os bispos ainda recebem.
O The New York Times contou como Wesolowski costumava cruzar a avenida à beira-mar da capital dominicana vestindo calças pretas e boné e dar dinheiro a engraxates para realizarem atos sexuais escondidos atrás de algumas rochas ou num monumento dedicado a um frade espanhol do século XVI.
Wesolowski, 66, foi ordenado há mais de 40 anos pelo então arcebispo de Cracóvia, KarolWojtyla, quem posteriormente se tornaria o Papa João Paulo II. Foi nomeado núncio apostólico para a República Dominicana em 2008 pelo Papa Bento XVI, hoje papa emérito.
Eis o texto completo da nota publicada pelo padre jesuíta Federico Lombardi, chefe do Escritório de Imprensa da Santa Sé:
“O ex-núncio apostólico JozefWesolowski recentemente apelou, dentro do limite prescrito de 60 dias, da sentença canônica mais severa de voltar ao estado laico que lhe foi imposto. A apelação será julgada sem demora durante o curso das próximas semanas, mais provavelmente no mês de outubro de 2014.
É importante observar que o ex-núncioWesolowski já cessou as funções diplomáticas e perdeu a imunidade associada e, como já dito anteriormente, o processo penal dos departamentos judiciários civis do Vaticano continuará assim que a decisão canônica se tornar definitiva.
Quanto às histórias que apareceram durante os últimos dias em vários meios de comunicação, faz-se importante observar que, desde que o caso foi proposto, as autoridades da Santa Sé moveram-se rápida e corretamente à luz do status de que o ex-núncio apostólico Wesolowski tinha como representante diplomático da Santa Sé. Esta ação se relaciona com o seu chamado a Roma e no tratamento do caso em relação às autoridades da República Dominicana.
Longe de qualquer intenção de acobertamento, essa ação demonstra o compromisso pleno e direto de responsabilidade da Santa Sé, mesmo em um caso tão grave e delicado, sobre o qual o Papa Francisco está devida e cuidadosamente informado e que deseja que seja tratado com justiça e rigor.
Devemos finalmente afirmar que o núncio apostólico já cessou as suas funções diplomáticas e perdeu a imunidade associada, podendo ser também submetido a procedimentos judiciais dos tribunais que possam ter competência específica sobre ele.”
Fonte – IHUSINOS