Lei Anticorrupção vai valer também para estataismas com restrições

carecaAs estatais e as empresas de economista mista também estarão sujeitas à Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013), mas sem sanções extremas. É o que disse o ministro-chefe da Controladoria-Geral da União, Jorge Hage, durante entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico no 2º Congresso Internacional de Compliance, que aconteceu nesta semana em São Paulo.

O ministro afirma que, pela regra literal da lei e pela amplitude dos seus quatro primeiros artigos, as estatais também devem ser punidas por atos de corrupção. Ele não considera, porém, que sanções como perdimento de bens e dissolução serão aplicadas.

“É razoável se imaginar que o estado de São Paulo aplicaria à Sabesp a pena de interdição de suas atividades? Ou dissolução da empresa? Como é que ficaria a [represa] Cantareira? A União perderia a Petrobras? Então, é algo em que o princípio da razoabilidade deve prevalecer sobre a letra da lei”, comenta.

Para Hage (foto), essas questões serão resolvidas pela construção jurisprudencial do Judiciário e pela atuação da Administração Pública. E sobre a aplicabilidade da lei no polo ativo, isto é, a possibilidade de uma sociedade de economia mista, sujeita ao regime de direito privado, também poder aplicar sanções, o ministro também disse que devem haver limitações.

“Pode a Petrobras aplicar uma pena à Shell, que é sua competidora? Me parece evidente que não. É mais algo que será necessário analisar com cautela sobre a atuação da lei”, comenta.

Segundo o ministro, no regime de Direito Administrativo sancionador da Lei 8.666 — Lei de Licitações —, qualquer entidade da Administração pode aplicar as sanções de multa, advertência e suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar, reservando-se apenas a sanção de inidoneidade à competência de Ministro de Estado e de Secretário Estadual ou Municipal (artigo 87, parágrafo 3º).

Problemas da lei
Hage também listou preocupações com o mau uso da Lei Anticorrupção. O ministro apontou a possibilidade de municípios pequenos e sob pouca fiscalização usarem denúncias apenas para receberem as multas previstas na lei.

Ele comenta que o Brasil tem cerca 50% dos municípios com até 10 mil habitantes e cerca de 80% não têm mais do que 50 mil habitantes e, por isso, a qualidade da gestão pública é “muito heterogênea”. “Há uma preocupação então de que possa haver problema com a aplicação de uma lei nova como essa, com penas graves como possui. Mas também temos a Lei 8.666, que prevê também uma pena pesada, que é a declaração de idoneidade, que impede a empresa de participar de licitações, e pode ser aplicada pelas prefeituras e desde 1993, e não aconteceu nenhuma tragédia”, disse. hage lembrou também que o combate ao mau uso da lei deverá ser feito pelo Ministério Público.

Os efeitos sobre a pessoa física quando houver admissão da infração pela pessoa jurídica, na celebração do acordo de leniência, também preocupam. “Isso de fato pode acarretar dificuldades para a pessoa física integrante da empresa que admite a prática do ilícito para celebrar um acordo de leniência. É algo que as empresas terão que administrar”, afirmou.

Outra preocupação é o possível conflito de competência entre instâncias administrativas de esferas distintas, por exemplo, quem pode instaurar o processo para apurar suborno de agente público estadual em licitação para aplicação de recursos federais. “Pode haver divergências sobre quem deverá instaurar o processo para apurar eventual suborno, conluio, fraude ou superfaturamento. A prática e a experiência vai esclarecer isso”, disse.

Ele citou ainda possíveis reflexos do acordo de leniência em outros regimes punitivos. “Digamos que uma empresa manifeste o interesse de fazer um acordo de leniência com a Administração Federal. Ela ainda poderá ser sancionada pelo Tribunal de Contas da União? Ou pelo Ministério Público da União? Isso está sendo alvo de tratativas”, afirma.

Verbas revertidas
O ministro defendeu que o dinheiro vindo das multas da aplicação da Lei 12.846/2013 seja revertido para a CGU ou para atividades de combate à corrupção.

“É o que nós precisamos fazer. A lei não define isso, a lei apenas estabelece que os recursos resultantes de aplicação das multas voltarão para aquele ente público. Mas o ente público, no caso, é a União. A CGU não é uma pessoa jurídica à parte, ela integra a entidade que é a União. Agora, nas regulamentações infralegais, nós pretendemos criar essa vinculação de que o recurso retorne para a CGU ou para atividades de combate à corrupção, como Polícia Federal, Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras] e outros órgãos voltados o combate à corrupção.”

Consultor Jurídico

 

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